quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Café

      As folhas alaranjadas caíam das árvores naquele frio outono-quase inverno. Numa cafeteria no centro da cidade, estava sentada uma mulher, bebericando um café quente e forte e mordiscando uma barra de chocolate. Ela olhava a agitação e a correria daquela manhã, observando enquanto as pessoas andavam rápido para pegar o metrô. Jennifer tinha pena desse tipo de gente. "Sempre correndo, sem aproveitar a maravilhosa vista pela qual esbarramos, sem sequer refletir sobre os infinitos sentimentos que um ser humano possa sentir. Ah, essas pessoas, sempre correndo, atrasadas, vivendo suas vidas miseráveis, indo ao trabalho apenas para mais um dia de sua vida passar sem nenhuma alegria, apenas brigas e estresses. A vida é curta, mas eles não entendem isso. Só precisam de dinheiro, é o que os deixam felizes. Otários", era o que ela pensava.
        Jennifer não "trabalhava", ela passava o dia pintando quadros e desenhando e, às vezes, fazia um passeio pela cidade. À noite, lia livros: românticos, engraçados, tristes, qualquer um que deixasse suas emoções fluírem e transbordarem. Era disso que Jennifer gostava: emoções. E era por isso que ela estava naquele café no centro. Ela queria saber o que sentiria se o visse de novo, se falasse com ele.
        Apesar de se localizar na parte mais tumultuada da cidade, a cafeteria não estava cheia. Era um local robusto, com escuras paredes de madeira e muitas mesas espalhadas pelo amplo espaço. Havia músicas instrumentais como plano de fundo. Jennifer estava localizada no final da sala, perto de uma das enormes janelas. Sua pele era clara, cabelos compridos cor de chocolate e olhos verdes profundos, daqueles que você olha bem no fundo e vê uma infinidade de coisas e possibilidades.
         Esses mesmos olhos localizaram o "alvo". Mateus Augusto. Seus cabelos loiros voavam devido a ventania. Seus fortes braços tampavam seu rosto para que nenhuma sujeira entrasse em seus olhos. E, por mais que não os visse, ela se lembrava dos olhos dele. Castanho-escuros. Ela sorriu. O romance deles era composto de sorrisos e olhares, relembrou.
         Ele entrou no café, deu bom dia aos funcionários e tirou o longo casaco preto. Tinha uma alta estatura, o oposto de Jennifer.
          Instantaneamente, o local parecia mais aquecido apenas com ele ali. Jennifer fechou os olhos e deixou as lembranças de 10 anos atrás inundarem sua mente.
         -Jenn? - Ela ouviu o espanto contido na voz do amado e abriu os olhos rapidamente.
         -É um prazer revê-lo, Mat. - Respondeu, tentando manter a voz firme e sem emoção.
          Aquilo era loucura, ela sabia. Reviver todas aquelas emoções... Mas era o que ela queria. Emoções. Estava cansada de viver todos os dias as mesmas coisas... Ela queria mais.
          -O que faz aqui? Por quê?  - Ele parecia cansado, irritado pela presença dela.
          -Sei que tem muitas perguntas, Mat, mas eu realmente não poderei respondê-las agora. Temos um assunto mais importante para discutir.
          - Não, Jenn, não temos. Você acha que não te conheço? Nossa história acabou há 10 anos, está encerrada e não há nada mais pra acrescentar. Mas você, no seu egoísmo, invade a minha vida do nada, depois de 10 anos provavelmente pra “sentir emoções”. – ele falava rápido e gesticulava com os braços. – Eu não sou seu boneco que você larga de lado e só pega quando está carente, não se trata pessoas assim, Jennifer!
     - Me diz se você não está feliz em me ver, Mat. Eu sei que está! Isso não é apenas por mim, é por nós dois! – ela se levantou para abraçá-lo, mas ele se desvencilhou. Jennifer suspirou e largou os braços ao redor do corpo. – Eu precisava te ver, Mat. Sinto sua falta. Tô cansada da solidão, do vazio e do silêncio do meu quarto. Eu quero sentir aquele nosso amor de novo e todas as emoções: alegria, êxtase, dor, tristeza, raiva, felicidade.
      - Esse é seu problema: você está sempre cansada. Da sua vida, das pessoas, de você mesma. Você não aguenta a solidão porque não suporta a sua própria companhia. Jenn, passaram-se dez anos. Eu segui em frente e não preciso mais de você e você não precisa de mim. Você quer um robô que te agrade e faça tudo por você. Sinto muito, mas eu não farei isso. Não adianta vir ao café que eu frequento pra tentar me ter de volta, porque no fundo você não me quer, você quer qualquer um que preencha esse vazio, essa falta de amor na sua vida, pra você sentir todas essas emoções que te fazem fugir da realidade. Para de fugir, Jenn. Encara tua vida. Chega de fingir. Olha, nós não temos nada pra resolver. Você cansou de mim e foi embora, eu sofri pra caralho, mas segui em frente e agora sou casado e tenho uma linda filhinha. Não temos nada pra resolver, mas você tem que se resolver consigo mesma. Espero que tenha sentido as emoções que queria, pois eu não senti absolutamente nada. Você disse o primeiro adeus e eu o repito agora – e para sempre – adeus, Jennifer.

       Então ele se virou e foi embora em direção ao metrô, sem nem pedir seu café com leite. Pelo menos, Jennifer teve o misto de emoções que queria, mas pela primeira vez, não gostou do que sentiu. Desabou na cadeira, as lágrimas escorrendo involuntariamente pelo seu rosto. Olhando para a rua, pensou em tudo que aquele que um dia ela pensava ter amado havia dito e não tinha mais certeza de quem tinha pena: dela, ou das pessoas que dizia desprezar no começo desse conto. Quem era o verdadeiro otário? Ela não sabia mais dizer. 

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Medo do escuro

  -Eu tenho medo do escuro. - ela me sentenciou, sussurrando, enquanto eu desfazia a trança de seu cabelo, nós duas sentadas em sua cama.
   -Não tenha, minha pequena. - respondi, aproximando-me dela. - Olhe lá fora, nunca está escuro de verdade. Há sempre a luz do luar ou uma janelinha acesa ao longe. Até quando vamos dormir, há uma claridade reconfortante ao nosso redor. - eu disse, apontando para a janela.
   -Mas não é esse escuro que eu tenho medo, mana. É o escuro dentro de mim. - ela apontou para o peito e sua voz falhou, como se ela estivesse segurando as lágrimas. E eu me assustei com sua fala, por sua idade tão novinha.

   -Mas esse escuro não é muito diferente do outro, querida. Também nunca vai estar completamente preto dentro de você. Vai ter sempre uma luzinha para você se agarrar, lembre-se disso. Ou a luz do luar ou a janelinha acesa ao longe. Mas agarre-se a ela e você saberá, dentro de você, que nunca está totalmente escuro, que sempre há uma claridade. E assim você nunca precisará ter medo. Lembre-se disso: a escuridão nunca domina totalmente e ela vai passar.

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Ironia

   É irônico, pois com toda essa dor no meu coração, com essa tempestade em minha alma, o céu brilha azuladamente. As nuvens do lado de fora se foram, mas aqui dentro elas ainda permanecem. As pessoas riem e brincam, se abraçam e se beijam, iluminadas pelos raios do sol. Como e por que elas estão felizes quando tudo ao meu redor está negro? Por que elas podem e eu não? É injusto.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Você

  Quando você vai para sua casa, gosto de relembrar nossos momentos.
  O sabor dos seus lábios, o calor da sua pele, a delícia do seu cheiro, a maciez do seu cabelo.
  O jeito como você me abraça forte, como se tivesse medo que eu evaporasse; como você sorri para mim e me olha, parece que não acreditando que eu estou junto a ti; lembro quando você suspira depois de um beijo.
   Penso em como é bom simplesmente estar abraçada com você, protegida nos seus braços, o melhor lugar para se estar. Em como sinto saudades no momento que você some da minha visão e em como eu preciso desesperadamente de você como preciso de oxigênio para respirar.
   Céus, é tanto amor que não cabe mais dentro de mim, que parece que eu vou explodir.
   E então passo o dia pensando em você, em nós. Nos seus gestos, nos seus agrados. Nos seus beijos e seus abraços. Em como sou feliz ao seu lado, como me sinto bem, em paz.
   Porque você é o único que me faz sorrir à toa, o tempo todo, relembrando nossos momentos, imaginando os próximos, contanto o tempo para te ver.

   E sorrio, sozinha, só pensando em você. E em como os melhores momentos do meu dia são quando falo contigo e os melhores dias da minha semana são quando te vejo.