As folhas
alaranjadas caíam das árvores naquele frio outono-quase inverno. Numa cafeteria
no centro da cidade, estava sentada uma mulher, bebericando um café quente e
forte e mordiscando uma barra de chocolate. Ela olhava a agitação e a correria
daquela manhã, observando enquanto as pessoas andavam rápido para pegar o
metrô. Jennifer tinha pena desse tipo de gente. "Sempre correndo, sem
aproveitar a maravilhosa vista pela qual esbarramos, sem sequer refletir sobre
os infinitos sentimentos que um ser humano possa sentir. Ah, essas pessoas,
sempre correndo, atrasadas, vivendo suas vidas miseráveis, indo ao trabalho
apenas para mais um dia de sua vida passar sem nenhuma alegria, apenas brigas e
estresses. A vida é curta, mas eles não entendem isso. Só precisam de dinheiro,
é o que os deixam felizes. Otários", era o que ela pensava.
Jennifer não
"trabalhava", ela passava o dia pintando quadros e desenhando e, às
vezes, fazia um passeio pela cidade. À noite, lia livros: românticos,
engraçados, tristes, qualquer um que deixasse suas emoções fluírem e
transbordarem. Era disso que Jennifer gostava: emoções. E era por isso que ela
estava naquele café no centro. Ela queria saber o que sentiria se o visse de
novo, se falasse com ele.
Apesar de se
localizar na parte mais tumultuada da cidade, a cafeteria não estava cheia. Era
um local robusto, com escuras paredes de madeira e muitas mesas espalhadas pelo
amplo espaço. Havia músicas instrumentais como plano de fundo. Jennifer estava
localizada no final da sala, perto de uma das enormes janelas. Sua pele era
clara, cabelos compridos cor de chocolate e olhos verdes profundos, daqueles
que você olha bem no fundo e vê uma infinidade de coisas e possibilidades.
Esses mesmos
olhos localizaram o "alvo". Mateus Augusto. Seus cabelos loiros
voavam devido a ventania. Seus fortes braços tampavam seu rosto para que
nenhuma sujeira entrasse em seus olhos. E, por mais que não os visse, ela se
lembrava dos olhos dele. Castanho-escuros. Ela sorriu. O romance deles era composto
de sorrisos e olhares, relembrou.
Ele entrou no
café, deu bom dia aos funcionários e tirou o longo casaco preto. Tinha uma alta
estatura, o oposto de Jennifer.
Instantaneamente,
o local parecia mais aquecido apenas com ele ali. Jennifer fechou os olhos e
deixou as lembranças de 10 anos atrás inundarem sua mente.
-Jenn? - Ela
ouviu o espanto contido na voz do amado e abriu os olhos rapidamente.
-É um prazer
revê-lo, Mat. - Respondeu, tentando manter a voz firme e sem emoção.
Aquilo era
loucura, ela sabia. Reviver todas aquelas emoções... Mas era o que ela queria.
Emoções. Estava cansada de viver todos os dias as mesmas coisas... Ela queria
mais.
-O que faz
aqui? Por quê? - Ele parecia cansado,
irritado pela presença dela.
-Sei que tem
muitas perguntas, Mat, mas eu realmente não poderei respondê-las agora. Temos
um assunto mais importante para discutir.
- Não, Jenn,
não temos. Você acha que não te conheço? Nossa história acabou há 10 anos, está
encerrada e não há nada mais pra acrescentar. Mas você, no seu egoísmo, invade
a minha vida do nada, depois de 10 anos provavelmente pra “sentir emoções”. –
ele falava rápido e gesticulava com os braços. – Eu não sou seu boneco que você
larga de lado e só pega quando está carente, não se trata pessoas assim,
Jennifer!
- Me diz se você
não está feliz em me ver, Mat. Eu sei que está! Isso não é apenas por mim, é
por nós dois! – ela se levantou para abraçá-lo, mas ele se desvencilhou.
Jennifer suspirou e largou os braços ao redor do corpo. – Eu precisava te ver,
Mat. Sinto sua falta. Tô cansada da solidão, do vazio e do silêncio do meu
quarto. Eu quero sentir aquele nosso amor de novo e todas as emoções: alegria, êxtase,
dor, tristeza, raiva, felicidade.
- Esse é seu
problema: você está sempre cansada. Da sua vida, das pessoas, de você mesma.
Você não aguenta a solidão porque não suporta a sua própria companhia. Jenn,
passaram-se dez anos. Eu segui em frente e não preciso mais de você e você não
precisa de mim. Você quer um robô que te agrade e faça tudo por você. Sinto
muito, mas eu não farei isso. Não adianta vir ao café que eu frequento pra
tentar me ter de volta, porque no fundo você não me quer, você quer qualquer um
que preencha esse vazio, essa falta de amor na sua vida, pra você sentir todas
essas emoções que te fazem fugir da realidade. Para de fugir, Jenn. Encara tua
vida. Chega de fingir. Olha, nós não temos nada pra resolver. Você cansou de
mim e foi embora, eu sofri pra caralho, mas segui em frente e agora sou casado
e tenho uma linda filhinha. Não temos nada pra resolver, mas você tem que se
resolver consigo mesma. Espero que tenha sentido as emoções que queria, pois eu
não senti absolutamente nada. Você disse o primeiro adeus e eu o repito agora –
e para sempre – adeus, Jennifer.
Então
ele se virou e foi embora em direção ao metrô, sem nem pedir seu café com
leite. Pelo menos, Jennifer teve o misto de emoções que queria, mas pela
primeira vez, não gostou do que sentiu. Desabou na cadeira, as lágrimas
escorrendo involuntariamente pelo seu rosto. Olhando para a rua, pensou em tudo
que aquele que um dia ela pensava ter amado havia dito e não tinha mais certeza
de quem tinha pena: dela, ou das pessoas que dizia desprezar no começo desse
conto. Quem era o verdadeiro otário? Ela não sabia mais dizer.