Esse texto é no
fundo um pedido de desculpas.
Hoje eu voltava para
casa, com essa alergia típica de inverno do louco tempo carioca
(esfria-esquenta-esfria) quando, ao espirrar, um senhor, à porta de sua casa,
me diz:
-Ih, minha filha,
também estou com essa alergia braba.
Eu apenas dei um
sorriso amarelo e continuei andando. Uns dois minutos depois, bateu-me um peso
na consciência. Aquele velhinho talvez fosse solitário e estivesse apenas
querendo uma companhia, ouvir uma voz diferente dos sussurros dos que já se
foram. Talvez ele estivesse apenas sendo simpático, sem segundas intenções.
Então, peço-lhe
desculpas, meu amigo. Sei que esse pedido não chegará ao senhor, e, se chegar,
talvez você nem se lembre desse episódio que durou 5 segundos. Mas minha
consciência fica mais tranquila sabendo que pude externar minha angústia.
Peço desculpas por
não ter te respondido propriamente. Mas espero que entenda que no fundo a culpa
não é minha. A antiga eu nunca teria te ignorado. Mas essa antiga eu não existe
mais. Ela sofreu decepções cada vez que saiu na rua. Ela não aguenta mais olhos
devoradores que a comem inteira e a deixam com vergonha, desejando não estar
ali, desejando voltar para casa, trocar de roupa. Ela não aguenta mais velhos
com seus sorrisos safados que a enojam. Ela não aguenta mais ouvir um "bom
dia" malicioso. Ou encoxadas no metrô. Ou gestos obscenos proferidos por
homens sujos. Ou buzinadas e risadas deselegantes. E aí parece que todo ser do
sexo masculino que encontramos na rua quer zombar de nós, nos humilhar. Como se
eles nos vissem apenas como meros objetos feitos para satisfazê-los. E não sou
apenas eu que estou cansada disso, somos todas. Isso acaba com nosso dia, nos
deixa mal.
Então, desculpe,
Senhor. Eu percebi que essa não era sua intenção. Mas a sociedade me ensinou a
me defender de qualquer ameaça que tenha um órgão sexual diferente do meu.
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